Aumento na tarifa: Veja o que cidades fizeram para isentar usuário da cobrança

Apesar de a gestão Tarcísio de Freitas ter optado pelo aumento da tarifa, temos, no Brasil, exemplo de cidades que adotaram o caminho inverso: aboliram a cobrança dos passageiros nas catracas. Entre algumas premissas, de acordo com elas, a eliminação da tarifa veio para facilitar o acesso das pessoas ao transporte e, consequentemente, às cidades.
Maricá
Um exemplo que podemos citar neste contexto é a cidade de Maricá, no Rio de Janeiro. Ela foi a primeira cidade brasileira com mais de 100 mil habitantes a acabar com a tarifa nos ônibus. A política vem desde 2015. Para sua efetiva implantação, a prefeitura criou uma empresa pública para operar as linhas municipais (a EPT).
De acordo com o prefeito da época, Washington Quaquá, a criação da nova política de mobilidade quebrou o monopólio de transporte privado na cidade. Antes da criação da EPT, duas empresas operavam as linhas: A Viação Amparo e a Costa Leste. Ambas detinham contratos de concessão que iam até 2020. Sendo assim, a princípio, tanto as linhas gratuitas da EPT quanto as linhas pagas das concessionárias operavam na cidade.
Para custear o programa, segundo compartilhou o Portal Mobilize em 2015, a prefeitura se utilizou de recursos do erário municipal; com dinheiro proveniente, por exemplo, de verbas que iriam ser usadas como subsídio às empresas privadas. Entrevistados, alguns moradores alegaram que o dinheiro economizado nas passagens ajudou na alimentação de suas casas.
Atualmente, de acordo com o último Censo (2022) do IBGE, Maricá tem pouco mais de 197 mil habitantes. Em questão populacional, seu tamanho é similar às cidades de Ferraz de Vasconcelos, na Grande São Paulo, e Santa Bárbara D’Oeste, na região de Campinas.
Vargem Grande Paulista
Já em terras paulistas, uma das primeiras cidades da Região Metropolitana que aderiu a esta política foi Vargem Grande Paulista, cidade a Oeste da Capital. Com pouco mais de 50 mil habitantes, o município disponibiliza seis linhas municipais para sua população. Em outubro de 2023, o sistema completou quatro anos de operação.
De acordo com a prefeitura de Vargem Grande, o programa “Transporte para Todos”, que inclui a tarifa zero, é uma parceria entre prefeitura e iniciativa privada. Para custear o serviço, a prefeitura utiliza-se, em parte, de taxas pagas pelas empresas instaladas na cidade. Segundo ela, o dinheiro que vai para o programa iria, outrora, para recargas de vale-transporte dos funcionários. “Vamos contar com o apoio dos empresários que irão ajudar a subsidiar o transporte municipal, porém com um valor inferior ao que já gastam”, informou o prefeito.
Os recursos vão para o Fundo Municipal do Transporte e Trânsito Urbano, que conta ainda com verbas de publicidade nos ônibus e de multas de trânsito, por exemplo. Além de fomentar o uso do transporte público, quando implantou a medida, a prefeitura afirmou que ela ajudaria na economia local; já que os moradores deixariam de se deslocar para outras cidades para atividades de trabalho e lazer, por exemplo – passando assim a gastar mais no comércio e serviços locais.
Atualmente, para usufruir do transporte gratuito, os passageiros precisam fazer um cadastro no site da prefeitura.
São Caetano do Sul
Outro exemplo na região metropolitana está na região do ABC Paulista. Isso porque São Caetano do Sul também conta com a isenção de tarifa a todos desde novembro. Por lá, de acordo com a prefeitura, o município pagaria a tarifa de cada passageiro, de R$5, à empresa privada que opera as linhas. Dias depois, foi anunciado o pagamento por quilômetro rodado, e não mais por passageiro transportado.
Entre as fontes de recursos, segundo matéria da CNN, estão a arrecadação com multas de trânsito, as tarifas de operação do transporte e do trânsito, vendas de créditos de carbono e publicidade nos coletivos.
Horizontes futuros
Embora diversas cidades São Paulo afora estejam conseguindo retirar a cobrança de tarifa nas catracas, especialistas alegam que, sozinhas, esta tarefa fica mais complicada. Para Rafael Calabria, especialista na área e coordenador de mobilidade pelo IDEC (Instituto de Defesa do Consumidor), falta um maior apoio do Governo Federal nos programas. Uma das pautas discutidas pela organização com o governo é a criação de um Sistema Único de Mobilidade.
Semelhante ao SUS (Sistema Único de Saúde), o “SUM”, como é chamado, consiste em uma organização que conte tanto com a participação da União quanto dos Estados e Municípios. Uma de suas principais bandeiras é a reorganização de como os recursos ao transportes são tratados hoje. Ele defende, por exemplo, que haja uma fonte de financiamento federal para os sistemas de transportes. Esta fonte incluiria recursos vindos do que hoje vai para os cartões de vale-transporte e taxas para carros, por exemplo. Desta forma, os passageiros não precisariam pagar tarifas nos ônibus.
A Proposta de Emenda Constitucional (PEC 25/2023) que trata do assunto tem como seu relator o deputado federal Kiko Celeguim. O parlamentar, inclusive, é ex-prefeito de Franco da Rocha, cidade da Grande São Paulo atendida por linhas da EMTU. O protocolo do projeto ocorreu por parte da ex-prefeita de São Paulo Luiza Erundina, hoje também deputada federal.
Ela, enquanto prefeita, inclusive, já propôs um sistema de Tarifa Zero na capital paulista no passado. Segundo reportagem da Folha, em 1992, Erundina propôs um sistema com quatro linhas circulares que atenderiam moradores do bairro Cidade Tiradentes, no extremo leste da cidade. A medida, no entanto, não foi para frente, já que um político de oposição a barrou na justiça, alegando ser “eleitoreira”. Naquele ano, ocorreriam eleições municipais para escolha de novo prefeito.
Impactos
[Opinião] A difusão dos programas de tarifa zero pela metrópole paulista pode deixar suas marcas no sistema de transportes da EMTU. A disponibilização de ônibus gratuitos no âmbito municipal, aliada às altas tarifas praticadas pela EMTU, pode acarretar em uma fuga de passageiros do sistema que, em vez de atravessar os limites do município para seus afazeres, tem a opção de economizar e muito ao optarem por permanecer na cidade. A fuga pode ocorrer, inclusive, por parte de passageiros que hoje preferem as linhas intermunicipais pela existência de integração com os trilhos – algo que muitas cidades não têm.
Como resultado, as chances de ocorrer uma redução na oferta de viagens de algumas linhas – e até mesmo o cancelamento de outras – são reais. Corrobora com a tese o fato de a disponibilização de ônibus e remuneração das empresas estar diretamente ligada ao número de usuários. Na prática, se a operação de uma linha não for lucrativa, ela estará em constante risco de deixar de existir.
Além disso, o governo do estado não dá qualquer indício de que está aberto ao diálogo de buscar formas de não aumentar, reduzir ou até mesmo zerar as tarifas. Ao comentar sobre o aumento, o governador Tarcísio de Freitas alegou que, caso não a aumentasse, necessitaria elevar os subsídios pagos ao sistema.
Consequência
Caso o estado não acompanhe a tendência cada vez mais presente de buscar formas de não onerar ainda mais o usuário – e as coisas tomem o rumo aqui apresentado -, duas coisas podem acontecer. Uma delas é os passageiros que seguirem dependendo do transporte metropolitano arcarem com viagens cada vez mais espaçadas.
Outra é a dependência de mais e mais integrações para atingir um destino que outrora atingia com apenas uma viagem – consequência da existência de cada vez menos linhas. Entre 2019 e 2023, segundo levantamento nosso, a Grande São Paulo perdeu 48 linhas da EMTU. Em contrapartida, houve a criação de apenas cerca de dez novas linhas. Entre os motivos, estão a queda na receita de algumas linhas (até mesmo em consequência da pandemia), contratos de concessão mal feitos e problemas políticos entre esferas do governo, por exemplo.
Cabe ao governo do estado entrar no diálogo do financiamento e unificação do sistema para evitar que nosso deslocamento fique cada vez mais difícil. E cabe a nós acompanharmos este debate e suas decisões.
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